Quando as pessoas eram pessoas
Julho 01, 2010
O taxista vira-se para trás e pergunta-me se eu tenho sentido a diferença. Não, não tenho. Mas nem sei bem do que fala. Eu olho pela janela e os carros parecem-me os mesmos. Quando começa a anoitecer, as luzes acendem-se. Como tem sido desde a primeira vez que reparei num candeeiro da minha rua a ligar já o céu estava a alaranjar. Aqui há pouca gente a circular pelas ruas. Mas ali à frente vão aparecer mais. E se as juntássemos todas numa praça ela ficaria cheia. Tenho a certeza. "Aquele ali é um companheiro dos fuzileiros. Do tempo em que as pessoas eram pessoas." Mas nem no Terreiro do Paço nem na Praça da Figueira, infelizmente. O corpo tenso da cidade ficaria mais satisfeito com uma demonstração maciça de vitalidade. Mas não vale respirar por dois quando nem sempre é fácil respirar por si mesmo. "Tem 78 anos e continua aqui. Já não o via há dois anos. Até pensava que ele já tinha... É impecável. Do tempo em que as pessoas eram pessoas e gostavam das pessoas". Não vale respirar por dois. Não vale tentar engordar para parecer que continuamos a ocupar todos muito espaço. Nem vale a pena fingir ou levar a sério a tarefa. Acabamos por encher com dificuldade a Praça da Alegria. E já nos devíamos sentir satisfeitos pela ironia do local.